Textos

O Admirador
Bruna desligou o telefone, irritada. Não antes de dizer alguns sonoros
palavrões ao seu interlocutor que só arfafa, numa espécie de ronco que ele devia julgar excitante. Mais uma vez, ela se lamentava por não ter ainda mandado instalar o bina. Iria descobrir quem era esse sujeito
irritante que já lhe ligava há quase um mês, sempre no mesmo horário,
quando ela já estava prestes a dormir. Bastava apagar a luz do quarto
para o telefone tocar, insistente, o que a fazia acreditar que ele
estivesse num dos prédios vizinhos ou em algum orelhão na rua. Olhava furtivamente pela janela para todos os orelhões e janelas abertas que conseguia vislumbrar, mas nunca conseguira identificar a origem das chamadas. Apagou novamente a luz e retomou o sono. Porém, como das última vezes, foi com ele que ela sonhou: seu interlocutor misterioso.
Nos sonhos, ele não falava nada. Sentava-se ao seu lado, segurando
suas mãos com carinho e arfava. Ao acordar, não conseguia recompor a imagem dele e isso a irritava ainda mais. Isso não podia continuar
assim. Na noite seguinte, ela iria tentar conversar com ele, ao invés
de simplesmente xingá-lo. Estava tão decidida que foi deitar-se quase
uma hora antes de seu horário costumeiro. Ao apagar a luz, esperou a
ligação, já com o aparelho no colo. Não tardou para que o tilintar
começasse. Atendeu, quase sem fôlego:
- Alô!
- Aaarrf... aaaarf...
- Olha... Isso não pode continuar. Você sabe onde moro. Venha ou me
deixe em paz.
E desligou o telefone, o coração na boca. E se ele fosse algum tarado,
se fosse um assassino? Que era louco, ela já sabia... quem, em sã
consciência, ficaria ligando para a casa de alguém durante quase um
mês, como ele fazia? Mas, ela ainda poderia não abrir a porta quando
ele tocasse a campainha. Essa possibilidade a tranqüilizou, embora a
excitação que sentia fosse tão incontrolável que já sabia que
certamente não faria isso. A campainha arrancou-a desses devaneios.
Olhou pelo visor da porta. Não podia acreditar no que estava vendo!
Ele era extremamente atraente. O rosto másculo, o cabelo muito curto, castanho, quase louro, liso. A boca perfeita, os olhos esverdeados, os ombros largos de nadador. Alto, bem vestido. Ela nunca o havia visto pelas redondezas, jamais se esqueceria de um homem assim. Ela também era uma mulher fascinante. Morena, os cabelos negros e ondulados escorriam pelas costas de um corpo exuberante. Sempre bronzeada, o corpo torneado pela musculação diária, aparecia sensualmente sob a lânguida camisola de cetim. Os olhos azuis, a boca carnuda e uma certa petulância, típica das mulheres que se sabem lindas a tornavam ainda mais irresistível.
Abriu a porta. Ele fez menção de lhe dizer alguma coisa, mas ela não
lhe deu chance, puxando-o pela gola da camisa para dentro do
confortável apartamento. Deu um chute na porta que se fechou com
estrondo e começou a beijá-lo, agarrada a ele, seus corpos
completamente colados. Ele correspondia às carícias, afoito,
atrapalhado, incrédulo com tanta impetuosidade. Com sofreguidão, ela o ajudou a tirar a camisa, desatando os botões, sem desgrudar sua boca da dele. Ele passeava suas mãos, agora com muita confiança por seu corpo, tateando a pele morna sob a camisola.
Ela se desvencilhou por um instante, deu-lhe uma camisinha e, em
instantes estavam na cama se amando como se houvessem sido feitos para isso. Depois de quase uma hora, exaustos e satisfeitos, eles
deitaram-se, olhando-se, admirando-se mutuamente.
Ele disse:
- Nossa! Você é linda!
Ela sorriu:
- Ué? Você fala?
- Claro que falo... Por que a pergunta?
- Porque ao telefone você só arfava...
- Eu? Telefone?
Foi quando ela entendeu:
- Não é você quem me liga todo dia e fica arfando ao telefone?
- Não. Eu vinha visitar minha irmã, que se mudou há pouco, mas acho
que errei o número do apartamento. Aliás, preciso mesmo ir vê-la...
Ela fez uma carinha de decepção. Ele sorriu, maroto:
- Mas posso voltar mais vezes, se você quiser...
Seus olhos se iluminaram:
- Venha sim... Meu nome é Bruna.
- Eu sou Jéferson. – disse ele estendendo-lhe a mão.
Em seguida, levantou-se, vestiu-se e saiu depois de um beijo terno.
Passados alguns instantes, o interfone tocou. Foi atender, aos pulos,
achando que já fosse ele, de volta.
- Sim, quem é?
- Arf, arf...
Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 15/03/2008
Alterado em 29/12/2009


Comentários