- Helena? Fecha essa janela.
- Ah, dona Zuleica. Tô vendo a cena.
- E eu, ouvindo. Que música horrível!
- Tá valendo.
- Mas o que é que est... Ah!
- E então? Não tá?
- Pra quem gosta de bombadão...
- Eu gosto.
- Deixa Roberto saber disso.
- Uai, olhar não tira pedaço.
- Tá certa. Mas olha os bonitos lavando carro com a janela fechada. Essa música tá me enlouquecendo.
- Será que quando eu ficar velhinha, vou ficar chata assim?
- Helena!!
- Pronto! Fechei.
- Como é que conseguem!?
- Ah, dona Zuleica, a garotada gosta. É o que toca nas rádios. Nas festas...
- Eu sei. Mas, não sou obrigada a gostar, né?
- Se tu morasse numa cidade pequena, dessas que só tem uma rádio, era o jeito.
- Ah! Isso eu sei. Vi a entrevista da empresária da Anitta, dizendo que esses caras compram as rádios e não deixam tocar nada diferente.
- Sério?
- Sim! E ainda teve esse escândalo dos cachês milionário em cidadezinhas totalmente carentes de recurso.
- Eu vi! Será que tem roubalheira?
- Mesmo que não tenha, é um escárnio! Tem cidade que não tem saneamento básico, que não tem receita suficiente para se sustentar. Aquela cidade lá na Bahia em que a prefeita sonhava com o show do Teteretetetê ia gastar a verba que recebeu para reconstrução após as chuvas que arrasaram o estado no início do ano.
- Credo!
- E ainda tem o fato de sempre ter propaganda política pró governo nesses shows.
- Ah! Daí, não dá para falar muito, que já te vi postando o povo xingando o coiso lá, em show.
- Pelo menos não é manifestação política paga com dinheiro público.
- A lei Rouanet não é dinheiro público?
- Certamente, o show da Pablo Vitar ou da Daniela Mercury não teve isso. Mesmo antes do exterminador do futuro do Brasil assumir, o limite máximo de valor a ser repassado era 45 mil. Agora, baixou para três e eu duvido que um projeto desses artistas que se assumiram contra o governo passaria para a captação de recursos.
- Me explica esse troço? O povo mete o pau, mas nem sabe como funciona.
- A lei Rouanet foi criada para incentivar a cultura, ajudar o pequeno artista a desenvolver um projeto, que tem que ser aprovado pela secretaria da cultura. Depois, ele tem que sair atrás de empresas que se disponham a investir nele, abatendo o valor aplicado do imposto devido. Depois, tem uma série de controles, todo gasto tem que ser comprovado e ainda tem contrapartida dos artistas que precisam se apresentar em escolas ou instituições sociais.
- Que trabalheira!
- E eles chamavam de mamata! Pior! Hoje, só passa projeto que interessa ao governo. Querem usar para publicar até propaganda de arma.
- Agora é que é mamata. É má e mata!
Texto publicado na minha coluna semanal do jornal Alô Brasília: