- Oi, Helena... Como você está?
- Jururu, ainda. Aquele velhinho gorducho me alegrava muito, o rabinho sempre abanando, as patinhas batendo no piso, pedindo para descer...
- E pra comer, né?
- É! Era engraçado. Não podia mexer em nada que ele gostava, logo ele aparecia com aquela carinha de “me dá”. Podia estar dormindo lá na sala, eu ouvindo o ronco dele daqui. Saudades...
- Nós, também. Mas é a vida. Ele tinha treze anos e muitos problemas de saúde.
- É... E vocês?
- Os meninos estão aproveitando mais. Ficam tristes às vezes, mas acho que termos viajado, ajudou. Não deu tempo de eles sentirem tanto a falta do bichinho. Difícil é a culpa. Quando o Fido internou, eu pensei em cancelar tudo, adiar não tinha mais jeito. Só que, logo depois, ele partiu. Não fazia sentido ficar aí, não havia mais o que fazer. Mas ainda sinto que é errado estarmos aqui nos divertindo.
- Nada. Depois de dois anos esperando, tantos adiamentos, tudo acertado com a escola dos meninos...
- Isso. E de resto? Nem tenho visto noticiário.
- Bom... Teve o ministro que caiu.
- Quem? O Milton Ribeiro?
- Isso. O dos pastores.
- Eita! O presidente tá fraco mesmo, hein? O Sales, ele segurou um tempão.
- Vi que foi pressão dos evangélicos.
- Faz sentido. Os peixinhos poderiam atrapalhar o esquema dos tubarões.
- Oi?
- Xá pra lá. Que mais?
- Hummm... Ah! Teve o tapa do cara do MIB, no Oscar.
- Hein?
- Aquele agente, do filme dos ETs, aquele, todo malandro...
- Ah! O Will Smith! Ele ganhou o Oscar? Que beleza!
- Então? O apresentador fez uma piada lá com a doença da mulher dele, porque ela é careca, e ele não gostou e deu um tapa na cara do outro.
- Tapa na cara? Desnecessário, né? O que a mulher dele tem? Câncer?
- Não. É uma doença que cai o cabelo.
- Alopécia?
- Acho que é isso.
- Sei lá! Errado demais fazer piada com a aparência dos outros, mas, tapa? Achei exagerado.
- Exagero foi o governo tentar censurar o festival lá do Lula.
- Festival do Lu...? Ah! O Lollapalooza? São shows, Helena! Não tem nada a ver com política.
- Igual a nossas conversas, né?
- É? Nossa conversa é um show?
- Não! Mas sempre tem um “fora, Bolsonaro!"
Texto publicado na minha coluna semanal do jornal Alô Brasília: