- Não para de chover, mais, não?
- As plantas precisam.
- As roupas no varal, não.
- Não tem nem dois meses que tava aqui reclamando da seca...
- E gostei quando a chuva veio. Mas podia dar uma folga, né?
- É, Helena! Isso é Brasília. Metade do ano a gente mofa, na outra, craquela.
- Sei quequeísso, não, mas se é rachar a pele e os beiço....
- É exatamente isso.
- Podia ser mais equilibrado, né? Chovia o ano todo, mas, só de madrugada.
- Seria melhor, com certeza.
- Não gosto de chuva. Fico meio jururu.
- Achei que era o Natal.
- Tem isso também.
- Está precisando ir ver sua mãe, né, Helena?
- Ai, dona Zuleica! Eu ia gostar. Mas, ainda não tô com coragem de me enfiar num ônibus por quase dois dias pra chegar lá.
- De avião, não dá?
- Nem! Tá tudo caro!
- E se parcelar?
- Fico no sufoco o ano todo.
- É... Foi-se o tempo que doméstica ia pra Disney.
- Oi?
- Nada, não. Tava lembrando do Guedes. Pelo menos, agora, que é ano eleitoral, ele teve que ceder e aceitar algumas medidas de erradicação da pobreza.
- Humpf! Aquilo ali, se pudesse, erradicava era os pobre. Ele e o chefe dele.
- Ainda bem que esse governo tá acabando.
- Tomara. O povo tá tão desesperado que arrisca o auxílio esmola valer uns voto.
- É o que ele espera. Mas, o valor é muito baixo. E ainda tem a inflação.
- Aff! Nem me fala dessa daí. Cada vez compro menos com o salário que tu me dá.
- Eu sei, Helena. Eu sempre tento dar seu reajuste um pouco acima da inflação. Mas, tá difícil acompanhar. Funcionária pública, sem aumento há quatro anos...
- Quem manda não ser polícia? Pros hômi, vai ter.
- Precisava lembrar, Helena? Agora, quem ficou jururu fui eu.
- Faz que nem eu. Bota a culpa no Natal. E na chuva que acaba daqui a pouco... Porque, se lembrar que esse governo ainda dura mais um ano...
Texto publicado na minha coluna semanal do jornal Alô Brasília
https://alo.com.br/chove-chuva/
Ou veja uma versão um pouquinho menor na edição impressa:
alo.com.br/impresso/qui-23-12-2021/
Estou na página 8, Vida & Lazer