Sed Lex
Assisti ao filme da Netflix Eu me importo (I care a lot), que conta a história de uma mulher que se aproveita da legislação americana para se apropriar dos bens de idosos, atestados incapazes por uma médica, sua cúmplice. O roteiro é brilhante, e, apesar de um viés cômico, toda a situação dramática dos velhinhos legalmente sequestrados pela protagonista é angustiante, ao ponto de se desejar que ela seja morta. Sim. Seu golpe é tão bem engendrado que parece que somente um assassinato poderia interromper sua carreira criminosa. Neste ponto, confesso que considerei o enredo algo perturbador, pois tracei um paralelo inevitável com a situação do Brasil.
Nossas leis têm tantas brechas, tantos meandros que facilitam a impunidade, especialmente dos crimes de corrupção, que nos parece até aceitável que se agridam alguns preceitos legais para garantir punição aos culpados. E aí entra a Lava Jato. A sede de vingança contra os salafrários que dominam o país e, mais especialmente, contra os "petralhas" que apareciam todo o tempo na TV como culpados de tudo, nos levou a considerar admissíveis todas as bandidagens perpetradas pelo "tribunal de exceção de Curitiba".
Agora que o STF decidiu pela parcialidade do juiz Moro, vozes iradas se levantam alertando para o risco de que isso seja apenas o início de uma sequência de anulações, que todos aqueles que a operação conseguiu prender ou castigar de algum modo poderão ser inocentados ou, ao menos, terem seus processos devolvidos ao estágio inicial. É bem provável que isso aconteça e não será culpa do Supremo, mas desses justiceiros que, arrogantes, ignoraram o devido processo legal e, como ficou evidenciado na fala de Gilmar Mendes, nem sempre pela melhor das intenções. Em que eles são melhores do que aqueles que condenaram? Em que somos nós, melhores que todos eles quando nos incomodam que se faça a lei para uns, mas não para outros, que temos por aliados?
E, finalmente, o que fazer quando for contra nós a inobservância da lei?
Texto publicado na minha coluna semanal do jornal Alô Brasília.
Veja no jornal acessando:
http://alo.com.br/impresso/qui-25-03-2021/
Estou na página 7, Vida e Lazer.
Imagem
daqui.