Ironia é colocar a imagem de animais em extinção
nas cédulas que os extinguem.
Aldo Teixeira
Gostaria de escrever um texto leve, hoje. Um que falasse de famílias, crianças, momentos felizes e bichos. Mas...
No final do mês de maio, um menino de quatro anos caiu no tanque onde Harambe, um gorila das planícies ocidentais (espécie ameaçada de extinção) vivia confinado desde o seu nascimento, também em cativeiro. Após dez minutos de muita apreensão, o animal acabou morto a tiros por representar, na opinião dos tratadores do zoológico, um risco à vida do garoto.
Depois disso foi a trágica morte do bebê de dois anos, afogado por um jacaré num resort da Disney e que resultou ainda no assassinato de vários outros jacarés, nas buscas pelo menino. A organização do local informou que tenta levar os répteis para áreas mais remotas das lagoas, mas que eles “não respeitam limites”. Ainda assim, não havia qualquer sinalização sobre a presença deles no local onde o ataque ocorreu.
E, se já não bastasse, nesta semana, a onça Juma, usada como enfeite para a passagem da tocha olímpica pela Amazônia, foi abatida após escapar numa troca de jaulas e atacar um militar. O Exército ainda tentou minimizar a participação da onça no evento, dizendo que ela não estaria ali com este propósito, mas isso não diminui a indignação pela sua morte.
Os três episódios vêm tornar ainda mais evidente nossa desastrosa relação com os nossos irmãos não humanos. Nós os acorrentamos, enjaulamos, invadimos seus habitats e os forçamos à convivência conosco, explorando-os de todos os modos possíveis, como alimento, roupas e calçados, como entretenimento, decoração… E, às vezes, a coisa nos foge ao controle, quando, então, eles pagam com a vida pela nossa estupidez.
É... Gostaria de escrever um texto leve, que falasse de famílias, crianças, momentos felizes e bichos. Quase consegui. Falei de famílias em momentos felizes: passeios, férias, a festa olímpica.
Mas não pude ser leve. Não há leveza na morte e é insustentável o peso da morte de inocentes, crianças ou bichos. Mortes que poderiam ser evitadas se soubéssemos ser um pouco mais humanos. Não especistas em nossa tola e nociva noção de superioridade sobre o resto da criação. Apenas humanos. Texto publicado na edição de hoje do jornal Alô Brasília.
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