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Você Sabe com quem Está Falando?

"Começar a conversa perguntando se eu lembro é bullying." Alexandre Oliveira

Coisa chata essa da memória da gente ficar pregando peça, né, não?
Eu vivo em saia justa por causa dela: esqueço nomes, caras, vozes, histórias de vida, confundo a Chica com o Francisca (precisavam ser tão parecidas!?), não dou mesmo uma dentro.
Uma vez, encontrei meu marido conversando com uma conhecida. Perguntei, surpresa e sorridente:
- Ué! Vocês se conhecem? De onde??
Ele foi seco:
- Ela é nossa vizinha, Nena!
Sei que não sou a única, mas se existir um ranking pra isso, tô nas cabeças! Felizmente, quase todo mundo tem um episódio nesta linha pra contar e, quando dou uma gafe muito feia, sei que a vítima se lembrará de alguma que protagonizou e a empatia desfaz um pouco o desconforto. Um pouco. Às vezes, a pessoa acaba ficando sentida.
Para evitar isso, meu amigo Paulão desenvolveu um método brilhante.
Almoçávamos com alguns colegas do trabalho, quando um rapaz aproximou-se dele, cumprimentando-o efusivamente.
Sem pestanejar, ele retribuiu ao cumprimento e perguntou:
- E você? Ainda está lá? Tem visto o pessoal?
O sujeito disse que já havia saído, deu notícias da Clara, do Pedro e do Celso. Paulão assentiu interessado e completou, quase entristecido:
- Puxa! Nunca mais vi ninguém.
Conversaram mais, riram da bagunça que o menino da Maria fazia por lá quando ela o levava.
Enfim, o sujeito foi embora e eu comentei:
- Pela sua cara quando o cabra chegou, achei que você não fazia ideia de quem era.
Ele riu:
- Continuo não fazendo.
- Hein!? Conversaram por horas! Perguntou se ele ainda estava lá!
- Ué! Se eu conheço é de algum lugar.
- E o guri bagunceiro?
- Todos são.
- Que cara de pau!
- Mas, funciona, né?
Grande Paulão! E o cara saiu satisfeito.
Por outro lado, tem gente que abusa do direito de constranger os incautos. Dia desses, o camarada chegou, me abraçou (conheço essa voz, eu pensava), perguntou do marido, dos cachorros, dos livros... E eu lá, perdidinha de Medeiros. Depois de muita tortura, finalmente, descobri: era um amigo sumido há uns dois anos e que fez a cirurgia do estômago. Trinta quilos a menos e quer que eu reconheça!?
Fossem trinta gramas e eu já não me garantia.


 
Texto publicado no Jornal Alô Brasília de 23/05/2014.
 
Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 23/05/2014
Alterado em 23/05/2014


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