Conversava com uma amiga sobre o Dia da Mulher. Ela foi taxativa:
- Não gosto! Acho hipocrisia! A mulherada aí sofrendo com violência, discriminação... E vem um dizer que flor e poesia resolvem tudo?
Não me choquei. Essa amiga também não gosta do Natal. Diz que tanta luz e brilho realçam ainda mais a solidão, o luto, guerras, rancores... Em cada presente há a desumana comercialização da data, tornando ainda mais evidente e dolorosa a desigualdade social.
Bonito isso, de se ter senso crítico. Ela está mesmo pejada de razão. Há tudo isso de ruim nessas duas datas. Há coisas igualmente desagradáveis associadas ao Ano Novo, dias dos pais, das mães, namorados. Se procurar bem, até no aniversário de cada um há motivos para, macambúzios, nos recusarmos a participar da festa.
Mas eu prefiro ser mais positiva. Não é ignorar defeitos, fingir que não existem. É tão somente não deixar que eles me tirem o prazer de dar um presente de Natal, homenagear as mulheres no oito de março ou cozinhar para minha mãe no dia dela. E o resto? Bem, quanto ao resto, procuro fazer a minha parte. Não, como o beija-flor da história do Betinho, tentando apagar o incêndio com seu biquinho minúsculo, mas tentando chamar à ação, aqueles que têm bicos maiores. Mesmo sabendo que, não importa quantas andorinhas venham fazer este verão, sempre haverá inverno.
Um bom exemplo é a proteção animal. Que luta inglória! A cada vinte bichos de rua, nove morrerão à míngua; três, logo após o resgate; cinco jamais deixarão o abrigo; dois serão devolvidos, perdidos ou maltratados pelo adotante e um, apenas um, encontrará um lar amoroso e será feliz pra sempre. Parece tão pouco, né? Não, para este último! E é nele que eu penso sempre que o desânimo vem me visitar, sempre que eu lembro que outros vinte acabam de nascer no abandono. Se é enxugar gelo, só peço que não me faltem panos secos.
Ser positivo é lembrar que se o esforço não é suficiente para resolver o problema, sem ele, só haveria o problema.
Ser positivo é não ter a alma pequena. A realidade já é por si só bastante dura para que embotemos em amargura o brilho das coisas belas.
Texto publicado no Jornal Alô Brasília de
21/03/2014, reeditado do texto
Senso Crítico não é Amargura, publicado neste Recanto das Letras em 10/03/2010.