Textos



Grávida, Eu??

Fui ali passar uns trotes. - diz a cegonha sorridente,
com a trouxinha de roupa suja no bico.

Mãe acidental é aquela que,
quando o exame dá positivo,
só vê pontos negativos.


 
Dia das mães passou. Chega de oba-oba e vamos falar das mães acidentais. São aquelas que, ao descobrir-se grávidas, passam por processo semelhante ao que acomete um doente terminal, frente à morte iminente: negação, raiva, negociação, interiorização e aceitação.

Na negação, ela desconfia do exame, do laboratório, do médico e faz tantas contraprovas quantas forem necessárias para ter certeza de que o resultado não muda.

Na fase seguinte, irada, ela brada aos céus, tem raiva de Deus, não se perdoa pelo erro boçal de esquecer a pílula num dia e tomar duas no dia seguinte para compensar.

- Confiar na tabelinha!? Irregular como eu sou? Onde é que eu estava com a cabeça?

E, se o namorado tenta dizer alguma coisa, ela atalha:

- A minha, imbecil!! A sua eu sei onde estava!

Na fase de negociação, busca soluções para desfazer o estrago. Tem jeito de disfarçar barriga numa adolescente com corpinho de modelo?

Aborto? Nem pensar! Entregar para adoção? Casar?

- Tá doida? O cara é só peguete!

Sem solução à vista ou a prazo, ela partilha o “problema” com as amigas que dão a maior força:

- Vai ficar linda de buchão!

- Gravidez tá na moda!

Ela, então, se anima a contar aos pais. O processo recomeça:

Negação:

- Mentira, filha! Pára com essa mania de fazer de tudo pra chamar nossa atenção!

Raiva:

- Como você pode ser tão burra?? Depois de tudo o que conversamos!

Negociação:

- Podíamos mandá-la pra Boa Vista até o bebê nascer, que tal?

Descartadas as hipóteses contrárias, irmanados, entram todos no rumo das duas fases seguintes: internalização e aceitação.

A vantagem é que aqui, a despeito das semelhanças vividas no processo até então, estamos falando de um nova vida e não da morte. Internalização e aceitação são fases leves, de visita a lojas de bebê para montagem de enxoval, consultas regulares ao médico, e ahs e ohs nas imagens pouco nítidas da ecografia. A barriga desponta e deixa de ter dono, pois todo mundo passa a mão. É aí que o processo está completamente concluído e a mulher deixa de ser mãe acidental para ser, simplesmente, “mãe”.

Meus pais tiveram sete filhos. Todos “evitados” por meio da tabelinha. Júlia, casada, dois pimpolhos, quando ainda amamentava o segundo, colocouum DIU. Na ecografi a de verifi cação, odiagnóstico:

- O DIU está no lugar, sim. E o bebezinho também!
- Hein!?

Aliás, Dilsons (DIU SONS - fi lhos do DIU) são bem comuns. Patrícia, também casada e com uma fi lha já quase mocinha, começou a enjoar, sentia-se inchada. Usuária do método havia alguns anos, foi ao médico investigar. O dispositivo havia saído do lugar e Daniel, lindo, veio ao mundo seis meses depois.

Já Suzi, chegou a entrar em pré-operatório para retirada de um monstruoso mioma. Foi quando detectaram que o mioma tinha perninhas, bracinhos e nome. Liliane nasceu, dois meses depois, com pouco mais de três quilos e muita saúde. E quando a mãe acidental parece ser o resultado de uma piada de mau gosto do Criador? Aurora, mãe de dois adolescentes, submeteu-se a uma laqueadura. Defi nitivo!


Pra que continuar se preocupando com isso?

De repente, começou a engordar. Resolveu conferir: uma fístula se formou após a cirurgia, permitindo a passagem do óvulo. Ela, bem humorada, só lembrava a piada: “vai
se chamar McGiver”. Pensando bem, pior ainda foi aquele episódio do lote de pílulas de farinha distribuídas por engano pela Schering do Brasil em 1998. Duzentos fi lhos da
incompetência de um nerd! Nem com a milionária indenização eu gostaria de carregar a barriga de alguma dessas mães!

Aí, eu imploro: para de conspirar contra, universo! Quero continuar nulípara!! De agora em diante, só vou de combo: dois ou três métodos ao mesmo tempo. Querogarantias!

É isso ou... Não! Celibato, não!
Taí porque é tão difícil fazer controle populacional: apesar de todo o risco de dar certo, ainda não inventaram coisa melhor do que tentar fazer neném.




Crônica publicada no Jornal Alô Brasília em 19 e 27/05/2012, e reeditado do texto homônimo, publicado neste Recanto em 12/05/2008.

Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 02/10/2012
Alterado em 25/01/2013


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