Textos




Muito Louca
Helsinque, 1952. Na cerimônia de abertura dos jogos olímpicos, ao término do desfile das delegações, encerrado pela própria Finlândia, a jovem alemã Barbara Rotraut Player entrou no estádio, usando um vestido branco e florido, deu meia volta na pista e chegou aos microfones, onde iniciou um pequeno discurso pela paz.
O público aplaudiu, pensando tratar-se de parte do espetáculo, até que seu solitário protesto foi interrompido pela segurança.
Depois, as autoridades da comissão organizadora do evento  vieram a público acusá-la de insanidade mental.
Façamos, então, um retrospecto do cenário mundial à ocasião. A II Grande Guerra havia acabado há apenas sete anos, com a rendição japonesa em 02 de setembro de 1945. A Alemanha, depois de duramente bombardeada, havia sucumbido meses antes, em 08 de maio, quando Hitler e Eva Braun suicidaram-se. Resultado prático: cinqüenta milhões de mortos, quase trinta milhões de mutilados.
Logo em seguida, tem início a Guerra Fria entre EUA e URSS. De um lado, os capitalistas defendendo a economia de mercado e a propriedade privada. Do outro, regime comunista e igualdade social sem democracia. Nessa disputa, apenas ideológica, as duas grandes potências nunca chegaram verdadeiramente a se enfrentar acuadas pelo que se chamou de Paz Armada, ou seja, ambas tinham tanto poder de fogo que a perspectiva de colocá-las em uso significaria, não apenas sua mútua destruição, mas, possivelmente, a de todo o planeta. Porém, foram quase cinqüenta anos patrocinando guerras menores pelo mundo e, na ocasião das Olimpíadas de Helsinque, tinha palco a Guerra da Coréia, onde sul e norte se enfrentavam, apoiados, respectivamente, por americanos e soviéticos. Foram quase três anos de batalhas sangrentas, um milhão de mortos para cada lado.
Outros fatos marcaram ainda aquele ano. Em fevereiro, Winston Churchill anunciou que o Reino Unido possuia a bomba atômica. A mesma responsável por cerca de duzentos mil mortos em Nagasaki e Hiroshima em 1945. Em março, os Estados Unidos apoiavam o golpe de estado que levou ao poder o governo ditatorial de Fulgêncio Batista em Cuba. Foram sete anos de um governo tirânico, corrupto e repressor, derrubado por ninguém menos que Fidel Castro que, por sua contemporaneidade, dispensa apresentações.
Voltando ao início deste texto: no estádio onde acontece a
festa da integração dos povos pelo esporte, uma jovem entusiasta dá meia volta olímpica usando um gracioso vestido branco com flores e implora, ao microfone: PAZ!
Enquanto isso, por detrás de suas mesas, homens poderosos decidem pelo destino fatal de milhões de pessoas, seres humanos como eu e você, a maioria deles, civis.
E fica a pergunta cuja resposta eu já sei: quem é realmente louco?

 




Republicação de texto homônimo publicado em 04/10/2008
Este texto faz parte do Exercício Criativo
Se É Loucura, Então, Melhor não Ter Razão
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Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 02/12/2011
Alterado em 02/12/2011


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