O Plano Quase PerfeitoQuerendo impressionar a nova namorada, Joca resolveu levá-la ao restaurante mais caro da cidade. Deu uma olhada na internet, praticamente decorou o cardápio. Melhor, decorou os pratos mais caros e os mais baratos do cardápio. Assim, ao apanhá-la e propor o programa, já jogou o caô:
- O frango grelhado de lá é ótimo! Nossa! Você nunca comeu nada igual.
Ela, sem perceber o direcionamento, dizia-se desejosa de comer camarão.
- Ah, amor! O camarão lá não é bom... Não é a especialidade deles. Prefere carne? Tem uma língua ao molho madeira ótima! Derrete na língua.
E desfilou elogios à tal língua ao molho madeira. Quando chegaram ao restaurante, ela já salivava com a idéia do prato.
Ao pegarem os cardápios, porém... Cadê o frango grelhado? Cadê a língua ao molho madeira?? Cadê os preços no cardápio??? Chamou o maitre:
- Oi! Eu estive aqui há algum tempo e provei da língua ao molho madeira de vocês e agora não estou encontrando no cardápio...
O sujeito pescou no ar a questão. Pareceu comprazer-se com o sufoco dele, ao anunciar, como se fosse uma ótima notícia que um novo chef de cozinha havia sido contratado há dois meses, especialista em pratos internacionais, formado por uma das melhores escolas européias. Joca tentou não perder o rebolado. Consolou a namorada da decepção por não encontrarem o prato tão propagandeado e pediu ao serviçal que indicasse algum outro:
- Ah! Os senhores vão gostar muito do nosso camarão à Provençal...
Joca, suando frio, agarrou-se na cadeira para não avançar no sujeito. "Camarão!! Isso é coisa que se ofereça?!" Cruzou os dedos sob a mesa, para que ela não aceitasse a sugestão. Talvez devesse ter cruzado também os dos pés:
- Hum! Eu estava mesmo louca para comer camarões.
De entrada, casquinhas de siri e uma salada de lagostim.
Na mesa ao lado, alguém abriu uma garrafa de vinho e o cheiro inebriante chegou até eles. Ela interessou-se.
- Para mim, não, meu bem... A lei seca, você sabe. Mas se você quiser uma tacinha.
Ela quis. Ele pediu um suco de laranja, tentando imaginar a quantas ia o prejuízo até ali.
Os camarões chegaram e, embora estivessem excelentes, ele continuava angustiado, quase não sentiu o gosto de nada.
Quando ela pediu o petit gateau de sobremesa ele, por muito pouco, não tentou demovê-la da idéia com o argumento de que ela não devia comer doces, pois estaria precisando perder uns quilinhos. Segurou-se no último segundo:
- Peça para você, meu amor. Eu preciso diminuir o consumo de doces... Dou uma colheradinha do seu.
A conta chegou e ele controlou-se com todas as suas forças para não subir na cadeira, gritando:
- O que é que eu estou pagando? O IPVA da Ferrari do dono dessa birosca?? Foi só um jantarzinho!!!
Lutou para demonstrar indiferença. Ela se propôs a pagar a metade.
- Não! - ele encheu a boca para responder. - Eu faço questão!
Pediu ao garçom a maquininha do cartão.
- Ah! Esse é de chip? O senhor terá que ir ao caixa...
Foi a sua chance: conseguiu que dividissem o valor no máximo de parcelas possíveis. Apesar de ter sentido as risadinhas à sua volta, a moça parecia ter mesmo permanecido alheia a todo o seu desespero.
No carro, toda dengosinha e afogueada, ela propôs encerrarem a noite num motel. Perfeito! Era justo o que ele queria. Exceto por um detalhe: aceitar seria a falência imediata. Joca desconversou, alegou cansaço, disse que precisaria acordar cedo no dia seguinte e a deixou em casa.
No caminho de volta, lamentava o fiasco da noite em que o acaso arrasou com seu plano perfeito. Depois de todo o esquema feito para impressioná-la, acabar a noite sozinho não parecia muito justo. Por outro lado... Depois desse rombo no orçamento, ia ser difícil levantar o “astral”. Melhor mesmo não ter ido! Prejuízo à imagem é bem mais difícil de reparar...
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Ah! Aproveitem para ler meus textos selecionados para a Câmara Brasileira de Jovens Escritores, edição de Agosto:
Poesia - Paixões e Calor de Primavera.
Conto - Amantes
Imagem daqui:
http://www.sparkling.com.br/index.php/2010/05/dicas-e-temas-jantar-romantico-para-o-dia-dos-namorados/
Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 20/08/2010
Alterado em 20/08/2010