A Caminho do Motel
Ele era motorista de táxi há pouco tempo. Havia ainda algumas áreas da região que não dominava bem e GPS era artefato existente somente em filmes de ficção científica.
Deste modo, não foi sem algum pânico que ele ouviu a passageira anunciar o destino: São João do Meriti.
Tocou viagem inseguro e quase não pode acreditar quando acertou a entrada da cidade.
Daí, em diante, não achou mais nada. A rodovia que ela indicou simplesmente não existia, por mais que rodasse.
- A senhora pode dar mais detalhes do endereço? - pediu, tentando ganhar tempo.
- Motel Pompadour. - respondeu ela, indiferente à olhada que ele lhe lançou, pelo retrovisor.
E ele não pode mesmo evitar a olhada. Desde que embarcaram, somente ela falou. O rapaz permanecia calado. Era bem mais novo, bonitão, bronzeado, jeito de surfista. Ela também ainda dava um bom caldo, notava-se que na juventude devia "bater um bolão".
- Motel Pompadour, certo... - repetiu ele, como se isso fizesse algum sentido.
Seriam amantes? Ela poderia ser a mãe dele. Talvez não, mas havia bem uns vinte anos de diferença. O mais provável é que ele fosse garoto de programa. Tinha um jeito meio servil, enquanto ela era mais refinada, um tanto decidida.
Enquanto rodava a procura do tal motel e lucubrava sobre seus passageiros, vigiava-os pelo retrovisor. Não queria que, com a demora em chegarem ao seu destino, iniciassem qualquer coisa ainda no carro. Seus olhares cruzaram-se algumas vezes, aumentando ainda mais a irritação dela:
- Moço, falta muito? - perguntou.
Ele resolveu confessar. Estava um pouco perdido.
- Olha! Eu vou desligar o taxímetro, tá? Daqui em diante é por minha conta.
Ela pareceu gostar da honestidade dele e acalmou-se. Ele, ao contrário, sentia-se cada vez mais desconfortável e uma crescente irritação foi dominando-o a cada quilômetro rodado. Até que:
- Puxa! Mas tem que ser esse motel, dona? Não dá para ser outro, não?
- Para aqui mesmo, moço. Vamos descer.
- Não, dona! Me desculpa, eu...
- Para! Tem um ponto de táxi bem ali.
Ele parou.
- Deve ter alguém que conheça melhor a região. Quanto eu lhe devo?
- Nada, não...
- Não, senhor! Eu faço questão. - e entregou-lhe o valor que o taxímetro marcava antes de ser parado.
Saiu arrastando o rapaz do carro e entrou no primeiro táxi da fila.
Ele reconheceu o motorista. Era um amigo seu. Resolveu segui-lo para ver onde era o bendito motel. Não rodou muito, logo viu os letreiros luminosos e bastante apelativos.
Observou surpreso, porém, que o amigo não entrou. Avançou um pouco mais e desembarcou o casal em frente a um prediozinho residencial, localizado logo ao lado. Então era isso. O motel era apenas um ponto de referência. Vai ver eram mesmo mãe e filho. Sentiu-se culpado, envergonhado por ter sido tão grosseiro...
Dias depois, encontrou o amigo num ponto. Comentou com ele sua desventura, seus erros de julgamento.
- Tá precisando rever seus conceitos, rapaz! - disse o amigo, rindo - Não foi a primeira vez que ela esteve no meu táxi. E, até que você não errou muito.... Só que ELA é a garota de programa.
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Este texto faz parte do Exercício Criativo - Não É o Que Parece
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