Textos


Um Longo Almoço de Domingo

Meu irmão mais novo se casou. A família da minha nova e bem vinda cunhadinha é de Aracaju e assim, a festança foi lá, na capital Sergipana.
Tirando os noivos, a família toda ficou numa grande casa alugada. Quinze pessoas, mais um agregado, amigo de infância.
Foi uma grande farra, com direito a praia, piscina, cajus catados no pé, camarões enormes, castanhas e caranguejos a preços bem acessíveis (nem sempre!!). Com direito também às confusões de uma casa cheia dos "gatilhos" como a que alugamos: a vela do filtro estava vencida há quase um ano, a geladeira não gelava, os chuveiros não esquentavam... Ei! Não venha me dizer que no verão nordestino não precisa-se de banho quente!! Eu tenho poucas frescuras na vida. Uma delas é não gostar de banho frio. Marido gaúcho, quando viu a churrasqueira chega brilhou os olhinhos. Claro que fizemos churrasco!! Pois a chaminé dava para o forro da varanda, espalhando fumaça pela casa toda. Um vaso sanitário entupiu espalhando coisa pior do que fumaça e... Ok! Ok! Mudemos de assunto.
Ao chegarmos do casamento, na madrugada de domingo, encontramos uma piscina ao lado da piscina. Um gato, feito numa torneira para distribuir a água para a máquina de lavar e o filtro, miou, quebrou e jogou água para cima em chafariz, molhando a roupa do varal e algumas tomadas. Foi um Deus nos acuda de belas em esvoaçantes vestidos longos e saltos altos e distintos cavalheiros com seus ternos e pisantes reluzentes a sapatear nas grandes poças à caça de um registro que permitisse impedir o dilúvio ou um curto circuito. Só depois de ligar para a dona da casa é que conseguimos descobrir que o único registro existente era o que fechava a entrada de água da rua, localizado na lateral externa, num buraco escuro e provavelmente repleto de baratas, onde enfiei minha mãozinha exitante até encontrar a salvadora alavanca. Para, em seguida, dar um grito e um pulo para trás, por causa de um calango que saiu apavorado do buraco. Não! Não perguntei a ele se estava mais apavorado do que eu... Ele desapareceu numa fresta da calçada. E eu só não me enfiei debaixo da cama porque era uma dessas box...
Depois da tempestade vem a bonança, diz o ditado. Após essa enchente, na segunda-feira, ao chegarmos da praia, não tinha água. Pelo menos, não nas caixas. Banho só de balde, ou no chuveiro da piscina com privacidade zero! Ah! E - claro! - água fria!
Uma família deste tamanho tem gente de todo ritmo e humor. Impossível sair cedo, pois os sobrinhos não conseguem acordar antes da dez. Difícil dormir cedo porque sempre tem alguém fazendo barulho até mais tarde e difícil dormir até tarde, porque eu e minha mãe somos madrugadoras, não conseguimos ficar na cama depois que o sol dá as caras. Sempre acabávamos acordando alguém ao preparar o café e este acordava mais alguém... No domingo, o azarado foi meu irmão que dormia numa rede na varanda. Em represália, saiu, às oito da matina, em panelaço pela casa, tirando todo mundo da cama, inclusive aqueles que haviam chegado da festa na segunda leva, depois das cinco da manhã. Auês à parte, foi o único dia em que a turma saiu pra praia num horário civilizado.
No frigir dos ovos, noves fora zero, foi ótimo sair um pouco da rotina, conviver mais com minha família que é mesmo maravilhosa, ver o mar... Lembrar Caymmi: "o mar, quando quebra na praia, é bonito, é bonito..."
Na terça eu e o consorte viemos embora, deixando o povo lá, às voltas com a casa e seus problemas... Tirei uma onda com minha sobrinha:
- Vou pra casa, você não vai, vou tomar banho quente, você não vai...
Ela, que não nega o sobrenome, respondeu na bucha:
- É... Vou lamentar muito por isso lá na praia, mais tarde...
Catei minhas tralhas e vim-me embora, murchinha. Aliviada de voltar ao conforto do lar e da minha vidinha bem estabelecida, mas com uma saudade danada desses dias em que vivemos mesmo um longo almoço de domingo.

*****

Na imagem, cinco sobrinhos, o agregado Miguel e o maridão.
Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 25/01/2010
Alterado em 25/01/2010


Comentários