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Por Impulso


Adjamília acaba de se separar. Chora, sofre e se descabela. Sabe que a culpa do fracasso no casamento foi muito mais dela do que dele. Pavio curto, qualquer motivo era pretexto para zanga, qualquer zanga era razão para desistir de tudo, arrumar as malas, ir para a casa da mãe. Das outras vezes, ele foi buscá-la e as pazes eram feitas na cama, apaixonadas, selvagens. Mas, essa montanha russa emocional cansa. Ele desembarcou.
Leocácia tem um bom emprego, um bom salário e, não importa em que equipe entre, faz sempre um excelente trabalho, celebrado por todos. Mas, basta um pequeno revés, um único desentendimento, para desejar mudar de área. Não adiantam conselhos: "espere um pouco, deixe a poeira baixar. Quando a raiva passar, você repensa essa decisão." Leocácia não aceita. Abandona trabalhos pela metade, deixa colegas na mão. Só nunca pediu demissão pois precisa muito do emprego, mas já tem a pecha de desequilibrada na empresa. E, por conta dela, já perdeu algumas boas oportunidades de ascenção.
Asdrubal destruiu seu trombone da cabeça de um maestro, Leopoldo costuma bater o carro em todo engraçadinho que faz alguma manobra arriscada na sua frente, o cabo Astrogildo já sacou sua arma até para fazer calar uma senhora idosa que reclamava alto na fila do INSS.
São pessoas que não têm domínio de suas emoções, acabam por colocar-se em situações arriscadas ou constrangedoras por seu descontrole e, invariavelmente, arrependem-se do que fizeram.
Explosões são inevitáveis na vida de todo mundo. Chega uma hora em que gente se cansa. E dá vontade de mandar tudo às favas. É é justamente nessa hora que precisamos parar para pensar.
Nenhuma decisão deve ser tomada num momento desses. Se possível, o ideal é trancar-se num quarto em penumbra, com música suave e deixar a raiva passar. Se há um amigo sincero com quem partilhar a dor, melhor. Amigos têm esse poder catalisador para nossa paz de espírito.
Se, depois de restabelecido o equilíbrio, perceber-se que a vontade de romper esse ciclo permanece, então aja. De forma equilibrada e respeitosa, principalmente se há relações afetivas envolvidas, lembrando-se de que o outro pode estar tão dilacerado quanto você.
Nem sempre agir impulsivamente é ruim. As pessoas apaixonadas agem por impulso e isso pode ser muito bom: comprar flores para ela sem motivo, convidá-lo para uma fugida a um motel no meio da tarde de trabalho, ficar até mais tarde para adiantar umas tarefas críticas no cronograma sem que o chefe precise pedir, presentear-se com aquele vestido lindo que lhe sorri da vitrine...
Mas, um pouquinho de pé no chão sempre é bom: as flores recebidas no meio do expediente podem provocar constrangimentos, a tarde de trabalho perdida pode causar-lhe transtornos, as tarefas adiantadas talvez dependam de alguma informação que você ainda não tem, o vestido lindo e sorridente não deve provocar um buraco no seu orçamento...
Saber equilibrar a magia de um ato inesperado com a racionalidade de ter os pés no chão é uma arte que exige exercício, ponderação, autocontrole... O bom e velho "contar até dez" de nossas infâncias.
Dependendo do caso, melhor contar até mil. E voltar ao um, de trás pra frente, se necessário.

Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 16/06/2009
Alterado em 18/06/2010


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