Textos



Pra Passárgada


- E aí? Tudo bem?
- Indo...
- Pra onde? Passou em algum concurso? Nem me chamou para estudar, né?
- Pra Passárgada...
- E tem concurso público pra Passárgada? Achei que pra ir pra lá só com pistolão.
- Pistolão?
- Sim! Não tem que ser amigo do rei?
- Ah! Quem é amigo do rei tem lá suas regalias. Mas pra ir pra lá, qualquer um vai.
- Oba! Então também vou!
- Desde que passe no concurso.
- Você passou?
- Não. Sou amigo do rei.
- Ah! Me leva?
- Faz o concurso!
- Por que?
- Porque o rei só tem amigos poetas. Você não é.
- E o que cai no concurso?
- Poesia.
- Poesia, você diz, daquela com versos e rima e tal?
- Também!
- Se eu aprender poesia você me leva?
- Se você aprender poesia, não preciso levar você. Você passa no concurso.
- Ah!
- Só tem uma coisa.
- O que é?
- Poesia não se aprende.
- Acho que você está enganado.
- É? Por quê?
- Poesia é sentimento. Sentimento, todo mundo tem! Há poesia num trabalho bem feito, numa mãe amamentando, num pai educando seu filho, num atleta superando limites, na despedida, no reencontro, na morte... Poesia é beleza. A natureza é pura poesia, a grandeza do universo, a riqueza de detalhes! Poesia é protesto. Há poesia, quando mulheres abandonam o conforto de suas cozinhas para queimar sutiãs em praça pública, nos estudantes de cara pintada nas ruas, nas passeatas pela paz, nas paradas gay. E escrever sobre tudo isso talvez não seja simples, mas qualquer um pode aprender. Normas cultas ou populares, regras, rima, ritmo, redação. É só querer. Tá tudo aí.
- Vamos.
- Onde?
- Pra Passárgada, claro! O rei vai adorar conhecer você.

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Inspirado em um bate-papo sem nexo com um amigo que estava meio triste e em resposta a uma amiga que estranhou meu texto de segunda-feira pois pensava que eu não gosto de diálogos.

Imagem daqui.

Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 30/04/2009
Alterado em 14/03/2012


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