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TPM


Já havia avisado que ficaria até mais tarde para terminar um relatório, cinco e meia o marido liga, voz melosa:
- A que horas você vai sair?
- Não sei... devo ficar até umas sete, pelo menos...
- Ah! Então eu vou ter que ir liberar o jardineiro?
- Acho que vai. Por quê?
- É que o Éder tá aqui... e eu queria saber se... “eu quero ir tomar uma cerveja”... – deu uma risadinha.
- Desde que libere o jardineiro antes.
As horas voando, o tal relatório não dava certo. O calor que me cozinhou o dia todo me deixando fedorenta cede lugar a uma brisa outonal gelada e eu, de blusinha de alcinhas. A chuva desaba, preciso passar no supermercado e vejo irem pelos ares meus planos de ir ao show de uns amigos lá na casa do chapéu.
Chego em casa tiritando, carregada de sacolas. O marido, com as cachorras, não consegue me ajudar.
Preparo o lanche, dou o remédio pras rottweillers, uma delas morde meu dedo na ânsia de se livrar da minha mão que tenta empurrar o comprimido para o fundo da garganta. Grito. Ela abre a boca assustada e volta a me empurrar com a língua, jogando o remédio no chão. Pego a droga da pilulinha com a mão e reinicio a batalha. Só fico imaginando quando ela tiver o meu peso e eu tiver que repetir esta operação...
Lanchamos sob a melodia do chororô das cadelinhas bebês. O marido me chama para ver o canil que, pelo visto, ainda demora pra ficar pronto.
Entrego-lhe a capa que comprei pro celular novo dele. Não encaixa. Ele reclama, meio que pede ajuda. Tento ajudar, ele não solta o telefone. Desisto. Vou ver o canil, ele fica pra trás, ainda quebrando a cabeça com o brinquedinho novo. Quando estou voltando, ele vem, quer me mostrar os detalhes da obra faraônica de acomodações caninas que está exaurindo nossas contas bancárias.
O telefone toca, é o amigo chamando para a tal cerveja. Ele vai. Quando ele chega, eu estou indo pra cama. Deito e apago. Exausta. Nem percebo quando ele deita também.
Até ser acordada por um rock pesado do Iron Maiden que ele baixou para o bendito telefone. Acordo assustada, peço-lhe para desligar. Ele sorri. Peço de novo, com um pouco mais de ênfase ou com um palavrão mais cabeludo, não lembro.
Ele age como se injustiçado, diz que ainda precisa descobrir como desligar.
Mais uns segundos e desliga. Depois, fica teclando: blip, blip, blip, blip.
Cubro a cabeça com o travesseiro para não cobrir a dele até sufocá-lo.
- Calma! Tô só programando o despertador.
- Pra quê, Cara pálida?? O meu já está programado e ao que me consta, AINDA não lhe mandei dormir no sofá!!
O cara-pálida continuou blipando o bagulhete e eu perdi o sono de vez.
Vim pro micro escrever. Estou com frio, irritada e com dores abdominais. O tempo está feio, as cachorras perceberam minha presença e estão chorando e eu tenho vontade de chorar com elas.
É TPM. Não! Não é tensão pré-menstrual. Nunca tive. Minha TPM é Tensão Provocada pelo Marido.
Tem cura?
Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 27/03/2009
Alterado em 14/06/2010


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