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Uma Grande Lição (humor - causo)
As entrequadras comerciais de Brasília foram planejadas para atender aos moradores das quadras circunvizinhas. Por isso, não possuem muitas vagas de estacionamento.
Porém, sabendo que papel aceita tudo e que, na prática a teoria é outra, não foi bem isso o que aconteceu. Há quadras que se especializaram num determinado tipo de comércio, como a 109 sul, por exemplo, conhecida como a rua das elétricas. Tem a rua dos restaurantes, a rua das farmácias...
Não é que todas as lojas só comercializem o mesmo tipo de produtos ou serviços, mas a esmagadora maioria delas sim. Isso atrai um público muito maior do que o previsto inicialmente, provocando uma grande confusão no fluxo de veículos.
Mesmo quadras onde não ocorreu a especialização, alguns mercados atraem muitos clientes, como é o caso dos bares e restaurantes. Acrescente a isso alguns caminhões desembarcando mercadorias, recolhendo lixo... Considerando que o brasiliense é definido como um ser de cabeça tronco e rodas, o resto é uma questão de matemática: há uma média de três vagas por estabelecimento, um restaurantes pequeno pode comportar até vinte mesas, um salão de beleza é capaz de atender cerca de seis pessoas ao mesmo tempo e a maioria dos comerciantes também possuem seus próprios veículos. Fica fácil imaginar a confusão. Em alguns horários do dia, para cada dois veículos estacionados corretamente, há pelo menos um parado em fila dupla, atrapalhando o trânsito e prendendo os outros dois ou três. No mais das vezes, o irregular fica atento à buzina dos outros, para liberá-los. No mais das vezes. Mas não sempre.
Contextualizada a situação, vamos à história de hoje. Estávamos num restaurante, quando alguém buzinou. Acostumados com o ritual, ninguém que não tinha porque se preocupar com isso, sequer olhou. Mas, a partir da terceira buzinada, cujo tempo de duração aumentou em progressão geométrica com relação ao da primeira, até por uma questão de solidariedade, as pessoas começaram a se irritar. Não com o responsável pelo barulho, mas com o engraçadinho que havia abandonado o carro daquele jeito. Chamaram a polícia, já sabendo que chamar a polícia numa hora dessas é somente um placebo. Eles não aparecem mesmo. Transeuntes aproximaram-se para ajudar. Alguém teve a idéia, juntou um monte de gente e balançando o carro para cima e para baixo, conseguiu-se liberar o coitado estacionado. Largaram o outro carro enviesado no meio da pista, atrapalhando ainda mais o trânsito, obrigando os passantes a invadirem um pedaço da contramão.
Alguns minutos depois, apareceu o causador da confusão. Caminhando como quem ia atravessar a rua, somente ao chegar perto do carro é que se denunciou, tentando abrir a porta e escafeder-se rapidamente. Mas não conseguiu sair impune. Não sei bem quem começou. Mas o restaurante inteiro levantou-se e o aplaudiu. As pessoas na calçada, contagiadas, acompanharam. Ninguém xingou, nenhuma reprimenda. Foi uma efusiva e apaixonante salva de palmas. Deve ter doído muito mais.
Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 03/03/2009


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