Areia, Cimento, Suor e Lágrimas
Eu tenho esse defeito... Eu me empolgo.
Passei três dias aporrinhando meu caro leitor com a temática dos acampamentos, não conseguia evitar. Quando eu achava que havia esgotado o assunto, logo vinham lembranças para me convencer do contrário, idéias em barracas de lona colorida que eu gostaria de compartilhar.
Agora, as lembranças e idéias vêm empoeiradas de cimento e cacos de tijolo. Muitos cacos de tijolo, pedaços de canos, entulho... Santo desperdício, Batman!!
São histórias de construção cheias de humor e horror.
Fique tranqüilo: não vou contar nada sobre a obra da minha casa. Esta, estou guardando para encher as paginas de um livro de terror stephenkinguiano, com direito a uma pequena visita a Poe: "Nunca mais, nunca mais".
Antes disso, eu e o marido já havíamos estado às voltas com tubos e conexões, tintas e cerâmica mais de uma vez.
Já havíamos reformado dois apartamentos. O último, pusemos abaixo, trocamos até a disposição das peças do banheiro. Isto nos fez acreditar ingenuamente que estaríamos preparados para tudo o que enfrentamos. Ledo engano. Cada obra é diferente, cada uma tem sua cota de mel e de fel. Muito mais fel.
Passamos por situações desagradáveis como quando eu fui ao apartamento vazio às sete horas da manhã de um sábado para esperar a empresa que ia colocar o gesso. Conforme combinado e confirmado. Nenhum lugar para sentar lá, levei uma esteira e um livro. Sem telefone, água e apenas com um banheiro meio depenado para usar, passei a manhã com cara de paisagem, ninguém apareceu.
Por outro lado, para cumprir o prazo combinado, o dono da empresa que contratamos, ajudado por um de seus vendedores, passou a noite de sábado instalando nosso carpete de madeira, à luz de lanternas, pois havia um problema na instalação elétrica. Este nos conquistou para sempre e depois dessa, já fez vários outros serviços para nós.
Quando Elano resolveu construir a casa dos seus sonhos, trouxe os operários de Unaí, onde a mão de obra é muito mais barata, além de bem qualificada. O duro era alimentar as seis bocas famintas, aqueles pratos inspirados no corcovado. Uma vez viu uma abóbora enorme no supermercado, a um preço muito atraente. Faria um belo quibebe com pedaços de carne. A piãozada não deixou por menos. Ao vê-lo chegando, com ela, começaram a comemorar:
- Oba! O patrão tá trazendo um leitão pra nós... Vamos ter leitão, hoje.
Se convivência cria atritos até entre pessoas que se amam, imagina o que acontece num ambiente cheio de testosterona, onde seis homens estranhos passam 24 horas por dia juntos. Um dia, ao chegar em casa, Elano teve que apartar uma briga, com direito a ameaças de morte e tudo. Felizmente, quem morreu foi o assunto. Na delegacia. Dois dos operários foram dispensados, atrasando a obra ainda mais.
Alex estava incomodado com uma pedra de uns quatro quilos enterrada na entrada da garagem. Contratou um rapaz para retirá-la. Ele começou a escavar em volta e foi escavando, escavando, os quatro quilos viraram quarenta, depois quatrocentos, ao final, concluíram que ela teria o tamanho de um fusca. Ele teve que locar uma britadeira para concluir o serviço.
Erros de projeto, mão de obra ou material inadequado e caro, processos trabalhistas, desperdícios, impostos, taxas e toda sorte de reveses acontecem numa obra. Por outro lado, é fantástico ver as coisas acontecendo, tijolos, areia e cimento se transformando em paredes, paredes compondo cômodos e estes, em algum momento, convertendo-se em um lar.
Depois da casa arrumada, as lembranças ruins vão sendo substituídas por outros tipos de problemas: problemas de fiação, rachaduras, infiltrações, goteiras, entupimentos... Essas coisas começam a incomodar e acabamos por querer nos livrar delas. Esquecemos o tudo que sofremos há tão pouco tempo e, em instantes, nos vemos pronunciando:
- Ei! Que tal uma reforma?
Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 04/02/2009