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Quando Pesa Demais


Eu e o marido gostamos de assistir a esses seriados sobre investigação policial, ver o trabalho técnico dos peritos e as artimanhas dos advogados e promotores: Lei e Ordem, CSI, Criminal Minds e suas variações.
Porém, todo esse trabalho fascinante somente acontece como conseqüência à ação de criminosos, ou seja, o ponto de partida para o enredo sempre é um crime. Ou vários. Com este mote, alguns episódios são mesmo muito pesados, envolvem estupro, pedofilia, tortura... Numa noite dessas, assistíamos um episódio sobre um assassino serial, autor de vários crimes terríveis, cada um pior do que o outro.
A covardia, a violência, o total desprezo do assassino por seus semelhantes estavam me incomodando e, felizmente, também ao meu marido. Concordamos em mudar de canal e paramos em um noticiário. Falava sobre o descaso do governo com a saúde pública. Mostrava a situação desesperadora de doentes à espera de atendimento nos corredores de um hospital, homens, mulheres, jovens, idosos e crianças, igualmente sofridos, igualmente sofrendo as suas mazelas, ignorados pelo poder público que deles deveria zelar. Na Globo, uma reportagem lacrimosa no melhor padrão global, trazia o combalido sistema educacional brasileiro onde professores mal pagos, mal treinados, desmotivados, tentam ensinar crianças semi-analfabetas amontoadas em escolas caindo aos pedaços. Uma reportagem na Record mostrava a ação de traficantes num morro do Rio, ilhando os habitantes do local, enquanto policiais mal pagos tentam detê-los, usando armas obsoletas contra o incrível armamento dos bandidos. Um canal descrevia o funcionamento de mais um dos esquemas de fraudes que sangra os recursos do Estado que deveriam estar resolvendo todos os problemas acima. Cansados de notícias sobre o Brasil, nos deparamos com o conflito na Faixa de Gaza, detalhes dos ataques, números de mortos... A última gota foi um canal que fazia a cobertura exclusiva do julgamento de um homem, acusado do violentar e matar um bebê de menos de dois anos de idade.

Voltamos para o seriado. Pelo menos, era só ficção.

Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 26/01/2009
Alterado em 09/08/2010


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