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Celeuma no Hospital


Estava escuro, quando o telefone tocou. Aurenice acordou assustada, conferiu o relógio: três e quarenta e sete. Era o irmão que, com a voz aflita, pedia ajuda. Estava com muita dor e queria que ela fosse apanhá-lo, para levá-lo ao hospital. A esposa não dirigia e, dentre os irmãos, ela era a mais próxima.
Levantou-se prontamente. O marido não quis deixá-la ir sozinha e também se arrumou.
Em menos de vinte minutos paravam embaixo do prédio de Aurélio. Ele desceu, amparado pela esposa. Mas, ela não foi junto: precisava ficar com as crianças.
Chegando ao hospital, ele foi logo atendido e foram conduzidos ao consultório da emergência.
Enquanto o médico o examinava, sentou-se ao lado do marido, sonolenta e apreensiva. O irmão era um sujeito forte, resistente. Para estar naquele estado, devia mesmo estar sofrendo um bocado.
O sujeito de branco rabiscou qualquer coisa num papel e mandou-os para a enfermaria, onde ele receberia a medicação.
Espírito alquebrado pela dor, Aurélio seguiu cabisbaixo a orientação, apoiado pela irmã e o cunhado.
A enfermeira que os atendeu, sorriu, tentando ser simpática, cumprimentou-os profissionalmente e tomou a receita das mãos trêmulas de Aurélio, a quem pediu que se sentasse. Começou então a tirar ampolas de dentro de um armário de vidro e aço e colocá-las sobre a maca, à frente dele. Em seguida, retirou uma seringa e mostrou-a a ele, para que visse que era descartável.
Foi quando ele acordou:
- Injeção!? Nem pensar!
- Mas, Aurélio... - Aurenice tentou argumentar.
- Não tomo injeção. - interrompeu ele, categórico.
- Mas, por quê? - indignou-se ela.
- Tá com medo, cunhado?
- Tô!
- Rá! Rá! Você? Com medo de injeção? Você não tem medo de nada, mano. Deixa de bobagem...
- Não vou tomar.
- Mas, o senhor precisa. Não quer ficar bom logo? - tentou paciente a enfermeira.
- Não quero!
Essa cizânia rendeu ainda uns bons minutos de discussão. Resolveram procurar o médico para que prescrevesse outra medicação. Não havia e ele juntou-se aos três, tentando convencer Aurélio de que precisava medicar-se para livrar-se da dor que, naquele momento, parecia bem menos incômoda, relegada a um nível de importância secundário diante de tamanha celeuma, ele, inexplicavelmente irredutível diante da agulha.
Aurenice apelou:
- Ah! Mano! Se soubesse que você ia fazer esse fiasco, tinha ficado dormindo...
Ele ia responder, malcriado, quando a dor recrudesceu e ele se deixou abater.
- Está bem! Aplica logo essa porcaria.
Todos respiraram aliviados. A enfermeira terminou de encher a seringa e virou-se para ele:
- Agora, o senhor abaixa uma beiradinha da calça para eu aplicar.
Sua energia voltou:
- Ah, não! Na bunda, não!

Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 08/01/2009
Alterado em 06/06/2010


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