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Acho que Eu Vou Desmaiar...
Estava assistindo à missa, em meio aos outros participantes do grupo de jovens, cantando o cântico da comunhão, todos em pé. De repente, o rapaz ao meu lado desabou no chão, primeiro como prédio implodido, os joelhos dobrados e a coluna descendo, ereta, os braços ao lado do corpo. Depois, saindo de seu eixo, o corpo tombou. A missa foi interrompida para que ele recebesse o socorro, já que o motivo do desmaio foi um ataque epilético, com direito a língua enrolada e tudo. Felizmente, em meio aos presentes, havia quem soubesse lidar com o problema e a conseqüência foi apenas um hematoma no joelho, magoado ao chocar-se contra o banco em frente.
Numa outra ocasião, num show de rock, estava com a minha turma atrás de um grupinho muito animado. Tive a impressão de que cheiravam lança ou loló, pois vi que passavam um lenço de mão em mão. Tive a certeza quando uma das meninas caiu como uma tábua, completamente dura, para o lado. Foi amparada pelo namorado, postado atrás dela e por uma das amigas, que dançava ao seu lado. Vi quando a levaram correndo para fora, para deixá-la respirar um pouco e depois quando ela voltou, meio amarelada e muito sem graça. Apesar do susto, parecia bem.

Nunca desmaiei. Já tive duas fortes vertigens, associadas a episódios de hipoglicemia com situações de estresse.
Uma delas foi quando, passadas já algumas horas do horário do almoço, a gente ainda aguardando a saída de meu pai do centro cirúrgico onde ele se submeteu a uma delicada cirurgia no cérebro. Quando ele voltou para o quarto, balbuciando algumas coisas ininteligíveis, o pânico de que ele podia ter sofrido algum dano irreversível foi demais para meu estômago vazio. Minha vista escureceu, fui tomada de uma fraqueza intensa e sentei, ou melhor, desabei no banco, que, felizmente estava atrás de mim. Graças a Deus a confusão mental que meu velhinho apresentou era apenas efeito da anestesia e em pouco tempo ele recuperou o doce brilho inteligente no olhar.

Na outra vez, o período sem alimentação foi muito maior. No início da tarde de sábado, acabou a luz no prédio onde morávamos. Apenas quatro apartamentos, o único vizinho estava viajando, não havia síndico e descobrimos que um fusível havia queimado. O problema é que o tal fusível era especial, não se achava em qualquer lugar e todas as elétricas que procuramos estavam fechadas. Já era noite quando minha mãe conseguiu um com o síndico do prédio dela. Fomos buscar. Encontramos o sujeito meio alegrinho, pelo visto vinha tomando umas cervejas desde a hora do almoço. Muito solícito, demonstrou-se preocupado, pois o circuito era de alta tensão, não era qualquer um que poderia efetuar a troca, sem as luvas e equipamentos de segurança adequados e se propôs a ir conosco. Propôs, não. Exigiu. Praticamente, condicionou o empréstimo à sua presença. Sem alternativa, aceitamos a oferta e o levamos conosco. Tudo certinho, ele realmente sabia o procedimento correto e, em instantes, o prédio estava novamente iluminado. Convidamo-lo, então, para conhecer o apartamento.

Abre parêntese. “Convidamo-lo” pode até ser correto, mas é feio pra caramba, né? Português tem dessas coisas... Fecha parêntese.

Por educação, oferecemos um uísquinho. Como temíamos, ele aceitou. Na saída, estava ainda mais tonto. O maridão ficou trancando a porta e eu fui atrás dele, para evitar que ele desabasse nas escadas... tarde demais. O vôo rasante sobre os degraus acabou numa poça de sangue, um corte feio no queixo, corremos com ele para o hospital. Se, nessa hora, o cabra macho já amarela, imagina o cabra macho meio mamado. Parecia uma criança:

- Fiquem comigo, por favor. Não me deixem sozinho com esses carniceiros.

Até tentamos. Mas, ver a agulha entrando e saindo daquela pele branca, passando por uma camada de gordura, o nível de açúcar no sangue lá embaixo, não deu outra... a vertigem bateu forte e, se o enfermeiro não viesse ao meu socorro me pedindo para deixar a sala, acho que eu desabava ali mesmo. Estava apenas a alguns segundos fora, quando o marido vem também, branco como uma folha de papel, igualmente expulso pelo enfermeiro.

Pelo menos, não fizemos como um nosso amigo. Ângelo havia combinando de sair com um primo, mas ao ligar para confirmar o programa, foi informado de que ele precisaria fazer uma endoscopia de emergência, antes de poder encontrá-lo:

- Você podia ir comigo. Se você me ajudar, termino mais rápido, e ficamos liberados logo.

Ele concordou. No quartinho do hospital, sua única atribuição era ajudar o médico a introduzir o tubo na garganta do paciente. Mas o examinado soltava uns arrotos, uns barulhos meio esquisitos e Ângelo apagou. Teria caído sobre o paciente, se não fosse o apoio do primo, que o empurrou com o ombro. O coitado acabou tendo que concluir o exame assim, sozinho, segurando primo, tubo, riso e a vontade de se matar por ter recusado a instalação de câmeras na sala quando aquela empresa de segurança passou oferecendo o serviço.
Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 30/07/2008
Alterado em 30/07/2008


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