Textos

Meu Pai Herói
Amo meu pai por muitas razões. Algumas delas já descrevi em outros textos.
Quem conhece suas histórias, ao ler este título deve estar achando que vou contar a vez em que ele, senhor franzino, ao ver um homem que boiava de bruços na linha da arrebentação, pensando ser um de meus irmãos, nadou sozinho na direção dele e trouxe o afogado até a praia, onde já quase na areia foi ajudado por outras pessoas.
Sim, meu pai salvou uma vida e isso o faz um herói.
Para mim, porém, seu maior ato de heroísmo, foi outro.
Logo que ingressei na faculdade, uma vizinha muito querida, empregada da Caixa Econômica Federal, conseguiu-me um estágio. Com o salário, custeava os estudos. Depois, passei num concurso público e comecei a exercer o pior emprego da minha vida, respondendo cartas na sessão de pensionistas e aposentados do Ministério das Comunicações. Eram cartinhas lacrimosas dos velhinhos pedindo aumento em seus proventos por terem ouvido falar de alterações nas leis que poderiam beneficiá-los. E o meu terror é que nunca eram extensíveis a eles. Em todo o tempo que trabalhei lá creio que não respondi nenhuma carta concedendo o que o pobre idoso estava pleiteando. Esse período marcou minha vida para sempre. Felizmente, como meu curso na faculdade era de computação, acabei conseguindo uma transferência para o setor de informática, novamente com a ajuda de amigos. Foi quando surgiu uma outra oportunidade de estágio, o salário muito próximo ao que eu tinha no ministério e, para desespero da minha mãe, larguei o emprego público.
Minha mãe tinha razão. Não deu certo. Fui assediada pelo chefe, que até tentar me prensar na porta do banheiro, tentou. Vivi o pior lado do deboche "É chato, ser gostosa!", acabei me demitindo e fui trabalhar no IBI, como auxiliar na secretaria. Talvez tenha tomado muito café forte sem açúcar ou perdido muito tempo preparando os cartazes educacionais, extravasando minha criatividade com guache e pincel atômico, não sei. Sei que mister David julgou-me inadequada ao serviço. Desempregada, não tinha condições de pagar a faculdade. A única saída seria trancar o curso por um tempo até conseguir alguma outra fonte de renda.
Foi quando o meu pai, de capa e espada, montado no garboso cavalo branco da minha gratidão proferiu a frase que eu nunca vou esquecer:
- A gente passa fome, mas essa menina vai estudar.
É claro que a gente não ia ter que passar fome. Talvez, abrir mão de alguns pequenos luxos como os sorvetes, iogurtes e refrigerantes, já esparsos, mas a decisão dele foi um incentivo e tanto para mim. Logo em seguida consegui outro estágio e pude continuar o curso.
Graças ao meu pai herói, acabei me formando aos dezenove anos de idade.


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Meu pai faria 79 anos neste sábado, dia 27 de junho.
Este é o meu presente.
Te amo, meu pai herói.
Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 30/06/2008
Alterado em 08/08/2013


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