Textos

Meu Problema com as Mulheres
Estava concluindo a leitura de um relatório, cabeça baixa, concentrado. Nem as vi chegar:
- Rodolfo, esta é Liz, sua nova estagiária. - disse Clarice, a feiosinha do departamento de pessoal.
Levantei os olhos do papel esperando deparar-me com uma daquelas adolescentes esquisitas, mascando chicletes de boca aberta, vestindo calças jeans sempre muito justas e camiseta curta o bastante para que a barriga se exiba, fornida de Coca-cola e Mc Donalds, saltada por cima do cinto cheio de metais e brilhos e, o mais irritante, os fones de ouvido pendurados no pescoço, senão enfiados nas orelhas. Dessas que não olham pra gente enquanto conversam, parecem estar sempre no mundo do Orkut, ostentando aquele ar entediado de quem já não tem mais nada a conhecer no mundo, que a gente vê aos montes nas ruas e que não dão o menor tesão num cara como eu, mas deixam loucos os outros homens do escritório. Não é que eu não goste de ninfetas. Apenas sou mais seletivo, tenho predileção pelas pós-adolecentes Nelson Rodriguianas... Quantas fantasias vivi ao assistir os Sete Gatinhos, ver Cristina Aché com aquele uniforme do colégio interno, paranóica e culpada e... Ah! Desculpe-me, estou divagando. Eu sempre faço isso quando o assunto é mulher... Mas, voltemos à Liz, minha estagiária nova. Quando olhei pra ela, meu queixo caiu. Longe de ser uma Cibele de roupinha de colegial ou uma dessas irritantes coisinhas andrógenas como eu temia, Liz era uma mulher de uns trinta anos, cabelos claros, cuidadosamente presos, olhos cor de mel, lábios carnudos, gostosíssima, pelo que pude discernir sob o elegante conjunto de saia e terno bege. Clarice observou, invejosa, o meu deslumbramento e não perdoou:
- É! Eu sei... ela é meio coroa pra estar fazendo estágio, mas casou cedo, blá, blá, blá e só agora pode voltar à faculdade.
Eu nem respondi. Retomei o controle:
- Obrigado, Clarice. Pode deixar que agora eu assumo. - e, fazendo questão de ignorá-la, a partir daí - Seja bem vinda, Liz.
Lamentava não ter tido tempo de esconder a aliança. Patético! Pensei. Ela vai trabalhar aqui. Como esconder a esposa e os dois filhos no dia a dia? Não que eu seja um cara infiel. Pelo contrário, amo minha mulher e temos uma relação incrível, muito sexo e cumplicidade. Além disso, sou boa pinta, gostosão mesmo e onde passo, a mulherada se oferece. Fácil demais: não há caça. Só pelo prazer do abate, as puladas de cerca perderam todo o tesão pra mim há alguns anos. Liz, sem querer e talvez até por isso, acordou esse desejo que andava meio adormecido.
Levantei-me e a cumprimentei. Seu perfume suave tirou-me do rumo novamente. Se não fosse a mesa entre nós, creio que teria tentado dar-lhe três beijinhos e um abraço, atitude absolutamente inadequada, dada a situação. Dei uma volta pelo departamento, apresentando-a à equipe. A machaiada ficou em polvorosa. Esses cuecas babam por qualquer rabo de saia, que dirá por aquele rabo... de saia. Mostrei a ela seu lugar e dei algumas orientações sobre o serviço. Aproveitei para sondar minhas chances. Soube que ela está separada há pouco tempo, mora com a filha de dez anos na casa dos pais e não tem namorado. Maravilha!! Pensei. Mas ela pareceu não me dar a menor bola, apesar de eu ter jogado algum charme. Era a aliança. Eu estava certo disso. Resolvi adotar o plano B.
- Queria ter essa coragem! Meu casamento acabou há anos. Só me seguro por causa das crianças... - menti, desavergonhadamente.
- É? Que pena! Pra mulher é mais fácil. A gente tem quase certeza de que ficará com os filhos, né? - ela respondeu complacente.
Percebi que ela havia engolido a isca.
Nos dias seguintes, vigiava os outros para que não pudessem aproximar-se muito e fiz de tudo para torná-la minha confidente. Contava as agruras que inventava sobre o meu relacionamento problemático, com sexo raro e brigas constantes. Fico me perguntando como é que ainda tem mulher que cai nessa lábia...
O fato é que ela caiu e, ao final de um mês, colhia os louros da minha vitória. Ela estava apaixonada e achava que eu também. Tolinha! Fomos amantes por quase um ano. Ela era realmente deliciosa e o tempo de conquista deu um tempero ainda mais irresistível ao caso. Até que começaram as exigências: queria que deixasse minha família por ela. Consegui enrolá-la ainda por uns meses, mas ela começou os joguinhos, vez ou outra esquecia coisas no meu carro, deixava recados no celular. Quando começou a ligar para mim lá em casa, não deu mais. Primeiro passo, retirá-la do meu ambiente de trabalho. Consegui um empreguinho para ela com um amigo. Depois, mostrar as garras: peguei a Teresa, a morenaça do almoxarifado que sempre me deu o maior mole e deixei Liz dar o flagrante. Enfurecida, me dispensou, o peito estufado, cheia de dignidade. Tudo resolvido: ela pensa que saiu por cima e eu ainda fiquei no lucro, já que a Teresa é ainda mais gostosa, topa tudo a qualquer dia e hora.
Agora, só preciso dar um jeito de me livrar da Teresa, que já está começando a fazer pressão também. Talvez se eu pegar a Islaine, da tesouraria...

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Este texto foi escrito como resposta a um desafio apresentado pela Dalila Langoni em maio: seríamos capazes de escrever como homens, tratando a temática da infidelidade masculina?
Depois de escrito, fiquei com tanta raiva do protagonista (criei um monstro!!!) que escrevi “Eu Sou Fiel” e achei mais adequado, pela leveza e bom humor do texto.
Hoje, vejo que o meu monstro não é muito diferente de tantos outros, que há por aí, então, resolvi trazê-lo à luz.
É uma caricatura, um estereótipo. Não se zangue muito com ele e menos ainda comigo.
Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 17/06/2008
Alterado em 15/12/2009


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