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É Castigo!!


Este texto foi inspirado no feriadinho da quinta-feira passada. O bom de ter um feriadinho assim, no meio da semana, é que temos uma semana com duas sexta-feiras. Por outro lado, há o inconveniente de termos, tambem, duas segunda-feiras. Ô diazinho chato esse que se seguiu ao feriado. Aliás, este foi o último do ano. Agora, só o Natal. Tá loooonge... Não posso reclamar. Este ano foi pródigo em dias de ficar de papo para o ar. Há anos que são tão ruins, mas tão ruins, que se têm a impressão de que até a sexta-feira santa cai num domingo. E a gente fica contando os minutinhos para que chegue logo o final de semana...

A verdade é que trabalho é castigo. Não acredita? Tá na Bíblia! Quando Adão aceitou o pedaço de maçã oferecido por Eva, Deus gritou de lá, entre outras maldições: "Ganharás o teu pão com o suor do teu rosto". Desde então, vivemos nessa batalha. Pensar que tudo isso foi por um simples pedaço de maçã! Se ainda fosse um bobó de camarão, uma lasanha aos quatro queijos... Certo! Antes que você comece a dizer que loira não tem jeito mesmo, esclareço: eu sei que a maçã em questão é apenas uma metáfora. Sei, também, que mesmo metaforicamente "uma maçã é uma maçã, é uma maçã, é uma maçã" (Francis Hime). Não é uma lagosta à termidor, por exemplo. Lamentável! Mas, deixemos a gastronomia e outros prazeres pecaminosos de lado e nos dediquemos ao suplício do trabalho.

Não entenda mal. Não pretendo fazer aqui uma apologia à preguiça. Embora me renda ao poder criativo do ócio, entendo que o ócio que nada cria tende a ser tedioso. Sou agitada, hiperativa, para desespero do marido que é mais contemplativo e adora ficar sentado na varanda olhando a paisagem. Eu até fico algum tempo junto com ele, antes de começar a me coçar agoniada para caçar o que fazer. E caço mesmo. Se não estou escrevendo, estou lendo, recebendo e enviando e-mails, fazendo contas, organizando a casa, limpando o aquário, cuidando das cachorrinhas... Faço trabalho voluntário atualizando o site da Proanima, organização não governamental de proteção animal, ou o site do Grupo Fazendo Kefir, para informação e doações de grãos... Fora os hobbies: tênis, teclado, violão, canto... Uma infinidade de coisas que faço, além do emprego propriamente dito, que me devora pelo menos oito horas diárias. Gosto do meu trabalho, da empresa que detém meu passe, da equipe, da chefia. Confúcio criou uma frase célebre que representa bem minha condição profissional: "Escolhe um trabalho de que gostes e não terás de trabalhar um único dia em tua vida". A gente sabe que não é bem assim. Até para ir para a balada, tem dia que dá desânimo.

Vez por outra, naquela preguiça de sair de casa, após o almoço na casa da minha mãe, brinco com ela:
- Ah, liga lá, fala que eu tô dodói!
E ela, boa mãe, nega.
- Mas, mãe! Trabalhar é ruim!
- Dê graças a Deus por ter um emprego, minha filha!
- De ter emprego eu gosto. Não gosto é de ter trabalho...

Estou errada? Quem nunca desejou que o despertador se dissolvesse como no quadro de Dali, desobrigando-o de sair da cama numa manhã fria de segunda-feira? Que atire a primeira pedra aquele que, ao ir conferir o resultado da mega-sena não se imaginou ganhador, para poder deixar o emprego imediatamente? Quem é que não fica até mais leve e saltitante ao assinar o aviso de férias? Aliás, nem precisa tanto. Basta chegar a sexta-feira para os ânimos se tornarem festivos e alegres. Por outro lado, é só o Faustão dar seus relinchos após o futebol no domingo para que os mesmos ânimos tornem-se macambúzios. Se pudéssemos trabalhar somente quando quiséssemos, talvez essa maldição divina não fosse tão cruel afinal. Mas, o trabalho exige disciplina, pontualidade, assiduidade, além claro, da competência, comprometimento, resultados... Para piorar há os colegas difíceis, chefes irascíveis, subordinados indolentes, concorrência, medo do desemprego e, nos casos extremos, os assédios: moral e sexual... Tem ainda o trânsito, irritante e perigoso, a procura por estacionamento ou a luta por uma condução no precário transporte público, as filas dos elevadores, restaurantes lotados onde se serve comida de qualidade duvidosa...

É muita pressão! É mesmo um castigo! E pensar que foi apenas por uma maçãzinha! Cá entre nós... Esta maçãzinha tem que ter rendido pelo menos uns bons orgasmos múltiplos pra valer tanto sofrimento, não é, não?

Imagem daqui.
Nena Medeiros
Enviado por Nena Medeiros em 28/05/2008
Alterado em 10/08/2010


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